terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

A resignação do PAPA Bento XVI.


Ainda na minha juventude, um dos livros que recordo ler, foi “O eleito de Thomas Mann”, este trata sobre a vida de um ser que nasce resultado de uma relação incestuosa e que se veio a tornar no papa. Quando surge a notícia da abdicação de Bento XVI, por sinal, tendo sido o primeiro a abdicar enquanto tal, vem-me logo à memória Thomas Mann e “O eleito”. No livro, mesmo parecendo um romance que recorrer à ficção histórica, era assim que eu o via na época, para quem o venha a interpretar mais meticulosamente, acaba por detetar todo um conjunto de informações que estão para além do simples romance ficcionado. Ao contrário que se pensa, este livro usa o estilo romance, mas recorrer a pesquisa histórica séria e aos valores espirituais para trazer muitos dos acontecimentos que terminam por fazer parte do livro.   
A imagem literária que o autor pretende transmitir, com o assunto do incesto, num sentido alegórico velado, entra no tema da dualidade humana que se esconde em todas as relações, inclusive na Santa Sé e nas suas hierarquias, ao mais alto nível. Não propriamente só no ato aqui representado pelo incesto, mas em todo o conceito de bem e do mal / do certo e do errado que a sociedade afirma só possível acontecer com certos seres humanos – os maus, aqueles que têm uma génese de maldade, quando na verdade, absolutamente todos, em determinados momentos da nossa vida, apresentamos essa característica a que todos estamos relegados – A DUALIDADE. Somos seres duais, aprisionados numa condição percetiva trina, este é o verdadeiro sentido velado do livro de Thomas Mann e aqui muito desse verdadeiro significado cruzam-se as motivações reais de Bento XVI com as de Gregório VIII.
Enquanto seres incapazes de perceber em plenitude uma determinada condição na sua totalidade, olhamos para ela, vendo um só ponto da escala e se esse ponto se aproximar, mais ou menos dos interesses benéficos para nós, percebemo-la como melhor ou pior, unicamente em função dessa perspetiva limitada em função do nosso aparente interesse. Por exemplo – Para nós, seres humanos é condenável matar um outro ser humano, mas em certas condições, como numa guerra, quem acomete sobre a vida de outro ser humano, que está oposto no campo de batalha, até pode ser considerado um herói.
Outro exemplo – Para a humanidade em geral é condenável mentir, mas muitos do que se chama segredos de estado, não são mais que mentiras dos que governam sobre os que são governados. Estes são dois extremos de uma escala, nos dois exemplos, mas dentro dessa escala podemos verificar um conjunto de pontos em que no dia-a-dia todos nos focamos, ou seja, estes são exemplos extremos, mas dentro destes, surgem todo um conjunto de possibilidades menos extremas, mas em todas elas, permanece essa dualidade – A comparação entre um ponto na escala de um outro ponto desse evento/acontecimento/ação.  
A dualidade é uma incapacidade para entender a existência no seu todo, tanto para quem tenta perceber, como para quem a executa, em parte, enquanto ato ou evento. Perceberemos sempre no interesse da nossa perspetiva e tudo o que executamos será também sempre, consciente ou inconscientemente, na condição dual, no melhor interesse para nós. Ninguém está fora deste condição a que o ser humano está condenado, pois ela é parte fundamental na constituição da ego-personalidade. Sendo esta que nos condena à dualidade e aos efeitos negativos a que ela nos remete, é também ela que nos garante a condição que nos sentirmos existir – eu sou.
O ato deste dois seres que por sinal, desempenhando funções de papa em épocas diferentes, abdicam por motivos aparentemente diferentes, na verdade, têm mais em comum do que possamos percecionar à primeira vista. Muito embora, os códices que regem as sociedades das duas épocas sejam diferentes, levando a que aparentemente os motivos do ato, apresentem diferenças, mas na génese dos dois atos, está a sabedoria que reside em ambos os seres de perceber essa dualidade em tudo o que é a vida, em todos os seres humanos, tendo plena cons-ciência que todos estamos sob os seus efeitos e ninguém vive acima dela enquanto ser na condição MALKUT.   

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