segunda-feira, 4 de abril de 2011

“…não atirai vossas pérolas aos porcos para que eles não as pisem com os pés…”

A interpretação, quase sempre, feita acerca de expressões como a citada, é sustentada pela cultura criada em torno do conceito errado no que concerne às denominadas linhas de “entendimento” e “compreensão”, isto no que à temática esotérica se refere. É fácil ver textos e mais textos, pensamentos e mais pensamentos que parafraseando esta citação, pretendem somente sustentar que o desenvolvimento espiritual e consequentemente o grau de evolução do ser Humano a este nível, está intimamente ligado ao grau cultural e inteligência, criando aqui quase que uma condição – está-se mais próximo de Deus, quanto mais culto e inteligente se é. Isto tem obviamente criado a condição de afastamento dos que se sentem menos desenvolvidos intelectualmente e por vezes, constata-se que parece que quem o divulga e cita, o faz com a intenção deliberada de criar de facto este afastamento, gerando aqui um fenómeno de elitismo absurdo que em nada corresponde à verdade.

Ora, nada mais há de errado neste forma de pensar, de agir e interpretar dita expressão ou outras com o mesmo sentido, importar aqui desmistificar tal facto em abono da verdade. É importante que esses citadores, uns conscientes do erro que comentem, outros por ignorância pura, reflictam sobre a temática. É fundamental perceber o significado de dois termos que são de importância nuclear para a base de raciocínio, concretamente: linha de compreensão e linha de entendimento, isto dentro do contexto de desenvolvimento espiritual, significam coisas bem diferentes, embora que nas línguas neolatinas, como é o caso do português, elas possam significar coisas idênticas, isto ao nível exotérico, mas em especifico, no contexto esotérico, não é bem assim.

O que normalmente se interpreta como inteligência, grau cultural, enfim toda a aptidão intelectual fruto da nossa herança genética e cultural, mesmo havendo a apetência para o desenvolvimento espiritual, todo este conjunto, não simboliza qualquer grau de desenvolvimento espiritual concretizado. No entanto este conjunto de características representam de facto e neste contexto, a interpretação conceptual da designada linha de entendimento. Temos maior ou menor capacidade para interpretar, aprender, quanto maior ou menor for a nossa linha de entendimento, ou seja, quanto mais inteligentes formos, mais cultos, etc. No entanto, sermos inteligentes e cultos, não nos garante ou nos dá por si, grau de evolução espiritual, este é independente destas características, pois um ser Humano menos desenvolvido culturalmente pode ter um maior grau de desenvolvimento espiritual que outro mais culto ou inteligente. Veja-se um exemplo marcante: um ser que só crê na ciência reconhecida como oficial – um materialista. Estes, são normalmente seres cultos e inteligentes, mas se ele nega a existência do espírito e por conseguinte da sua vida espiritual, certamente terão um grau bastante reduzido de desenvolvimento espiritual, aqui até por opção ou se pretenderem, por negação da sua existência e não por incapacidade. Basta isto para perceber que a linha de entendimento (cultura, inteligência, etc.), não são sinonimo de grau espiritual, podendo alguém muito inteligente e culturalmente evoluído, não o ser tanto ao nível espiritual.

Contrapondo a este conceito, temos a linha de compreensão, sendo o anterior conceito a definição para a “capacidade para interpretar”, esta última é a definição do “modo de realizar”. Assim sendo é esta que pode influenciar o nível de evolução espiritual do ser Humano e não a capacidade que este tem para interpretar e entender.

Para facilitar o seu entendimento farei aqui uma analogia. Imaginemos que o objectivo para a chamada linha da vida é representado pela distancia que vai do Porto a Faro. Havendo para tal a possibilidade de cada ser Humano desenvolver a aptidão para utilizar qualquer meio de transporte para lá chegar; vários tipos de automóveis, motos, bicicletas, avião, etc., etc., podendo até mesmo usar vários ao longo do percurso, desde que tenha adquirido as competências para o saber utilizar. Aqui a aptidão para o uso do meio de transporte a utilizar representa o grau de inteligência, nível cultural, etc. ou seja, a capacidade para utilizar - nível de entendimento. No trajecto, não há sinalizações, mas apenas algumas pistas que nos podem dar indícios, não é obrigatório seguir um determinado percurso, mas é necessário, não sendo também obrigatório, passar por alguns pontos de controlo, imaginemos que geograficamente de 100km em 100 km existissem postos de controlo onde todos deveríamos passar, aqui os pontos de controlo representam o desenvolvimento espiritual e para sabermos chegar ao próximo temos que ter conhecido o anterior. Os meios utilizados e as decisões tomadas para a nossa orientação são de livre vontade de cada. Assim aqui a forma como tomamos as decisões face ao que entendemos, mediante os meios que temos à nossa disposição, é que expressa a linha da compreensão e por conseguinte, é esta que influencia directamente o tempo que vamos demorar, os erros que iremos cometer, se nos vamos perder até atingir o fim do percurso. Repare que pode haver quem tenha ao seu dispor excelentes meios de transporte, mas se o “viajante” não tomar as decisões correctas, pode atrasar-se mais do que quem utilize um meio de transporte aparentemente menos vantajoso para o fim que é chegar o mais rápido possível, mas identificando todos os pontos de controlo. Grande parte das vezes a aparente desvantagem de ir mais devagar e/ou com meios mais singelos no percurso que é a vida, podem tornar-se uma vantagem à hora de descobrir que devemos ter a calma necessária para perceber todos os sinais e não passar velozmente ou/e orgulhosamente, sem nos apercebermos dos pontos de controlo.

Na arvore do vida, na Cabala, existem 636 formas diferentes do ser Humano compreender, então podemos concluir que existem várias formas para o ser Humano interpretar o que consegue entender e todas elas levam ao mesmo lugar, é aqui que reside a questão:

Na expressão “…Não atirai vossas pérolas aos porcos para que eles não as pisem com os pés…” a verdadeira mensagem que ela contem e que tem vindo a ser deliberadamente, ou não, adulterada, prende-se de facto com o alerta para a incapacidade do emissor e não para a critica ao receptor por ser incapaz de dar valor aos conhecimentos contidos nos ensinamentos. Como podemos dar valor a algo que não entendemos porque nos é desconhecido? Mesmo para um ser Humano muito evoluído espiritualmente (sendo aqui o termo evoluído composto pelo grau de conhecimentos esotérico e desenvolvimento espiritual) existem níveis de imperceptibilidade para os quais precisamos do devido contraste para que se nos manifeste, isto não quer dizer que não exista, mas sim que nós não temos percepção da sua existência, por sua vez, não conseguimos sequer dar valor, pelo simples facto de desconhecermos a sua existência. Se assim não fosse, aqui também se aplicaria a citada expressão, mas não é assim, esta apenas alerta quem detém o conhecimento, para a forma como este o deve adequar à capacidade de compreensão daquele a quem se pretende chegar. Não é verdade que todos os ensinamentos esotéricos só sejam possíveis de ensinar numa linguagem erudita e consequentemente de acesso a eruditos, mas sim a todos os que a queiram receber e para tal deve o orientador ter a sabedoria de alinhar a sua didáctica com a linha de compreensão de quem recebe o ensinamento.

Sejamos pois humildes e pacientes para com os outros, como os nossos mestres são para com cada um de nós. O dom da sabedoria expressa-se pelo acto contido na expressão: “A Deus chega-se pelas práticas e não pelas orações”.

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