quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

O Iniciado, o menino e o peixinho vermelho.



Quanto mais observava a humanidade, mais angustiado se sentia.
A humanidade procura sempre provas fáceis para tudo, como diz o ditado popular – “Ver para crer”. Mas a vida é um jogo de paradoxos, mesmo sem percebermos, vivemos rodeados por eles e em função deles, sem nunca os compreender.
Certo dia, logo pela manhã, ao acordar e dirigindo-se à cozinha, foi surpreendido com o fato, de um dos dois peixinhos de aquário, colocado no parapeito da janela estar morto, do lado de fora do aquário. Percebia-se que tinha saltado de dentro do aquário, provavelmente horas antes, pois o local onde estava e o próprio, estavam já completamente secos. Estando em pleno inverno, devido às baixas temperaturas, seriam necessárias horas para que a água resultante desse salto, se tivesse evaporado. Por isso, todos, ao chegar à cozinha, com a intenção de fazer a sua primeira refeição, vendo tal cenário, concluíam que tal evento teria ocorrido, algumas horas antes.
Tinha sido deixado ai, para que o membro mais pequeno da família, motivo pelo qual o aquário e os dois peixes ali se encontravam, visse e percebesse que tinha havido um acidente. O peixinho estava há poucos dias lá em casa, provavelmente sem querer, saltou do aquário e desse salto, resultou a sua morte. Mas seria importante que fosse o menino a constatar, pois certamente assim ele entenderia melhor o seu desaparecimento.
Quando todos tinham abandonado a cozinha e se preparavam para explicar o acontecido ao menino que se encontrava no quarto. Tendo ficando a sós na cozinha com o peixinho, o pai do menino, olhou para ele, ali sem vida, completamente seco, prostrado, ao lado do seu breve lar e sem pensar, deu-lhe um suave toque com os dedos, deixando-o ficar entre os seus dedos polegar e indicador. Com o toque, de imediato, como que se esse toque levasse o sopro de vida, o peixinho mexeu-se. Sem qualquer espanto, ele pegou-lhe com esses mesmos dedos e colocou-o dentro da água, no aquário. Logo percebeu que o peixinho tinha voltado à vida.
Quando todos os restantes entraram na cozinha para mostrar ao menino o seu peixinho morto, já este se encontrava, de novo vivo e em movimento, dentro do aquário. Pensativo, o pai do menino, quando questionado por todos, sobre o que tinha ocorrido, apenas afirmou – “Talvez se safe, desta vez.”
O peixinho vermelho, não se encontrava com a vitalidade do seu companheiro de aquário, nem com a vitalidade que lhe era comum, mas dava para perceber que tinha voltado à vida e provavelmente viveria. Mas como?! Questionavam-se em casa, todos os adultos. Não apenas o pai sabia e por isso nada questionava, também o seu pequeno filhote, sem fazer qualquer comentário, demonstrava que a sabedoria está para além da curiosidade do ego que quer saber só para saciar-se, pela simples satisfação desse ego. Ambos sabiam que era tal natural como o contrário, pois se viver e morrer é natural, também natural pode ser morrer e viver?! Por que não?! Só aqueles que percebem e os que querem perceber pelo ato genuíno de perceber, sem o interesse do ego, não questionam, apenas sentem e desse sentimento, resulta o pleno entendimento. Por isso o menino não levantou qualquer questão, mas os adultos sim, esses reagiram, como qualquer adulto, típico da ação do ser adulto, já completamente envolto no seu ego. Uns pela expressão contida no sarcasmo – “Foi milagre.”, outros pela negação do entendimento imposta pelo fenómeno da racionalidade – “O peixinho ainda estava vivo, só pode!”.
Os únicos que não questionavam, era o menino e o seu pai. O primeiro, porque sentia, por isso percebia com o coração e assim sendo, nada era estranho para ele. O segundo, não só sabia porque sentia com o coração, como sabia porque tinha plena consciência do fenómeno.
Desse saber, desse fenómeno, a única importância estava em perceber que nada do que tinha ocorrido, transgredia duas das condições que sob qualquer pretexto ou motivo, podem ser transgredidas – As LEIS de DEUS e as leis da natureza. A primeira representada no livre-arbítrio e a segunda nas condições da deterioração fisiológica dos tecidos que a pós-morte provoca. Desde que nenhuma desta tivesse sido quebrada, tudo estava bem, tudo era normal. Não importava se o peixinho tinha estado fisiologicamente morto, apenas importava saber que o seu livre-arbítrio não tinha sido contrariado e que a lei da natureza não tinha ainda exercido os efeitos que tornariam impraticável o seu retorno à vida, sem contrariar a lei da natureza.
Já para o ser humano comum, envolto na egocentricidade e na ignorância a que ele remete, o que importa é perceber se há milagre. Todos sonham em ter a prova contundente, vista com os próprios olhos, se existem ou não existem milagres, mas quando colocado à sua frente tal ocorrência, é tal a sua cegueira que não só não vêm o que sempre procuraram ver, como não vêm o que de verdade teriam que ver – perceber a verdade que está pro traz de tal acontecimento e daí tirar os devido ensinamentos.
Por isso todo o Iniciado, consciente do atual estado em que a humanidade se encontra, pensa e sente – “Quanto mais observo a humanidade, mais angustiado me sinto.”  

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